Sobre a voz que temos num mundo de homens brancos, héteros e destros …
Jakeline Plácido Marcon
Mulher, feita para ser companheira de Adão, inclusive feita da costela dele. Audaciosa, porém em demasia. Influenciou Adão a comer a maçã, o que o deixou frustrado com as consequências. Eita, Eva! Sempre querendo ganhar o mundo, prejudicou Adão. Se mantenha em suas obrigações de esposa, não dê palpites nos negócios.
Hipátia, egípcia, outra mulher audaciosa, cometeu o despautério de, no século IV, se tornar professora de Alexandria. Recebia pessoas de terras distantes para falar sobre astronomia, matemática e filosofia. Tanta audácia, não era pra menos, foi assassinada pelos cristãos, que precisavam defender os bons costumes, é claro.
Tereza de Bengala, mulher, negra, não sabia o seu lugar, virou rainha e liderou um quilombo de negros e índios. Este mundo está perdido e não é de hoje!
Chiquinha Gonzaga, em 1899, aos 52 anos, após décadas dedicadas à música, conheceu e apaixonou-se por João Batista Fernandes Lage, um estudante de música de 16 anos. Que horror!
Mulheres, temos séculos de luta, de enfrentamentos, de perdas e de glórias, para, no século XXI, reduzir a luta feminina à pauta da naturalização dos pelos na axila ou, ainda, pela liberdade de mostrar os peitos em público. Toda luta superficial e rebelde, sem fundamentos e indicadores sólidos causa apenas exposição e ridiculariza a mulher, o que é um prato cheio para a comunidade conservadora de plantão, já que amam nos chamar de loucas e desequilibradas.
A nossa luta não precisa ser pela perda da feminilidade, esse fato é peculiar a cada personalidade, livre para ser ou não ser da forma que bem entender. Mas sim pelo fim da violência física, psicológica, sexual e patrimonial, pela equidade e igualdade. De acordo com a UNESCO (2020), a violência contra as mulheres e meninas é uma pandemia invisível. Uma mulher é morta a cada 2 horas de acordo com os índices de violência.
Eva, Tereza de Bengala, Hipátia, Chiquinha Gonzaga, e infinitas mulheres que lutaram contra padrões estabelecidos, tinham algo em comum. Todas foram incompetentes e imperfeitas em suas “obrigações femininas”. Não deram conta de tudo, não se submeteram ao que os outros prospectaram para a vida delas, não aceitaram as opressões, foram fiéis `a própria essência. Todas tinham uma razão de ser, seja artista, guerreira ou cientista, lutaram!
É urgente ser imperfeita em quase tudo!
*Jakeline Plácido Marcon é secretária municipal de Educação e integrante da Academia de Letras de Cianorte