Programa Emprega + Mulheres e a proteção da parentalidade
*Paulo Sergio João
A Lei 14.457, de 21 de setembro de 2022, que institui o Programa Emprega + Mulheres, tem recebido atenção especial porque sinaliza um conteúdo social ímpar e que não deixa de gerar questionamentos quanto à natureza obrigacional do que dispõe.
Considere-se que as hipóteses abrangidas pela lei nem sempre dizem respeito a fatos e condições de conhecimento prévios das partes na relação de trabalho, mas de ocorrências que surgem no curso do cumprimento do contrato de trabalho como, exemplificativamente, nascimento de filho, adoção ou atendimento a pessoa deficiente. Nem por isso, tais circunstâncias da vida poderiam ensejar a dispensa de empregados o que poderia ser caracterizado como ato de discriminação indireta.
Citada lei, seguindo o escopo de sua pretensão, apresenta 3 abordagens: (i) destinou-se à inserção e à manutenção de mulheres no mercado de trabalho por meio de medidas como pagamento de reembolso creche e subvenção de instituições de educação infantil; (ii) a Lei fomenta flexibilização de regime de jornada de trabalho por meio do teletrabalho, regime em tempo parcial, compensação da jornada, jornada de 12 x 36 horas, antecipação de férias individuais e horários de entrada e saída flexíveis; (iii) incentiva a qualificação de mulheres por meio de suspensão do contrato de trabalho e incentivando a cursos de qualificação dos serviços nacionais de aprendizagem, com priorização de hipossuficientes e vítimas de violência doméstica.
A Lei ainda se refere ao apoio do trabalho das mulheres no retorno da licença maternidade, com suspensão do contrato de pais empregados para acompanhamento do desenvolvimento dos filhos e flexibilização na prorrogação da licença maternidade.
Institui a possível criação de Selo Emprega + Mulher para identificar as boas práticas pelas empresas, com prevenção e combate ao assédio sexual e outras formas de violência no trabalho, além de estímulo ao microcrédito para mulheres.
Mas, no parágrafo único do artigo 1º aporta, no nosso sentir, o aspecto mais relevante na sua aplicação, ao definir o que se deve entender por parentalidade, considerada como “o vínculo socioafetivo maternal, paternal ou qualquer outro que resulte na assunção legal do papel de realizar as atividades parentais, de forma compartilhada entre os responsáveis pelo cuidado e pela educação das crianças e dos adolescentes, nos termos do parágrafo único do art. 22 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).”
Destaque-se, portanto, que o foco de proteção a partir do vínculo socioafetivo é a educação das crianças e adolescentes com valorização do vínculo socioafetivo maternal, paternal estendido a qualquer outro que resulte na assunção legal do papel de realizar atividades parentais.
Deste modo, a Lei está destinada a colaborar e instrumentalizar as empresas para que complementem sua função social com a criação de oportunidades para que o trabalho não seja óbice à educação de crianças sob responsabilidade de pessoas de qualquer gênero e em qualquer circunstância.
Assim, há disposição expressa quanto às alterações de modalidade de contrato de trabalho às mulheres para o teletrabalho, abrangendo a primeira infância ou pessoa com deficiência sem limite de idade; flexibilização da jornada de trabalho, horário de entrada e saída; concessão de períodos de férias ainda que não completado o período aquisitivo.
A Lei ainda traz como forma de apoio à parentalidade a suspensão, sem prazo legal definido, do contrato de trabalho de pais empregados com a finalidade de dar atenção, em período pós licença maternidade da mãe, a cuidados e estabelecer vínculos com os filhos, acompanhar o desenvolvimento dos filhos e apoiar o retorno ao trabalho da esposa ou companheira.
Para aqueles que se preocupam com a eficácia da lei e de sua efetividade, observa-se que a Lei é desprovida de sanção, ficando a iniciativa de adoção do Programa exclusivamente a critério das empresas e dependente de negociação individual ou coletiva e, considerando a atuação dos sindicatos, talvez estes pudessem propor acordos coletivos de modo programático, pelo menos, a fim de que a lei se torne efetiva.
*Paulo Sergio João é advogado e professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.