Educação só melhora com mais participação dos professores

Reportagem traz compilado de ações desenvolvidas pelo Governo Estadual em prol da educação paranaense

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Na próxima sexta-feira (29) não haverá aulas na rede estadual de ensino. Um milhão de alunos ficarão em casa, assim como boa parte dos 95 mil professores em todo o Paraná. Em Curitiba, sob orientação do sindicato da categoria, uma pequena parte deles fará uma manifestação que terminará na Praça Nossa Senhora de Salete, na frente do Palácio Iguaçu, sede do governo estadual. O motivo é o aniversário do que ali ocorreu há um ano, quando, na tentativa de se evitar uma votação na Assembleia Legislativa sobre mudanças no sistema de seguridade dos funcionários públicos, que acabou ocorrendo, houve um confronto entre quem queria invadir a sede do Legislativo e a Polícia Militar, que utilizou bombas e balas de borracha para impedir a invasão. Houve feridos. Para o Ministério Público, que recebeu denúncia a respeito da ação policial, não houve culpados no incidente.

A avaliação dos alunos que frequentam as 2.500 escolas públicas do Estado é uma das piores do País. No ano passado, numa escala de zero a dez, os alunos do ensino médio receberam nota 3,8 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), criado em 2007 pelo Ministério da Educação para avaliar a qualidade do ensino através do desempenho dos estudantes através de testes de conhecimento. Num estado que detém a quarta posição em desenvolvimento no Brasil, é um paradoxo saber que, num setor fundamental como este, não haverá variação positiva quando forem revelados os novos índices neste ano, segundo informa a própria Secretaria da Educação, baseada nas avaliações que faz periodicamente.

Entre as reivindicações dos professores, que têm grande poder de mobilização e fazem isso quase sempre por motivação financeira e com um verniz político, e a constatação da indigência das notas de desempenho do aprendizado, o aluno fica perdido e seus pais sem saber o que fazer, até por falta de informação e poder de avaliação crítica sobre o que de fato acontece. O futuro das crianças, portanto, corre risco.

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Gráfico mostra investimento na área

Os professores têm um papel fundamental na vida dos alunos, não apenas com o ensinamento e aprendizado do conhecimento científico acumulado ao longo da história, mas também com atitudes e comportamentos que todos levarão para a sua trajetória pessoal e profissional, ensina a professora Ana Seres Trento Comin, secretária da Educação do Paraná.

Ela assumiu o posto logo depois os tristes acontecimentos de 29 de abril e, sempre que pode, repete a expressão o chão da escola para reforçar o que aprendeu em quase quarenta anos da profissão escolhida depois de abandonar o caminho que ia trilhar na matemática.

Este chão está a anos-luz do slogan que o sindicato dos professores, que estão sob a responsabilidade da entidade, escolheu para ratificar neste ano o que pensa: Escola, território de luta e resistência.

Quem acompanha há muito tempo o que vem acontecendo com o ensino público do Paraná retrata de forma paradoxal a triste realidade: o aprendizado do aluno ficou num terceiro plano nas prioridades de quem tem a maior responsabilidade disso – o professor.

Recentemente, em artigo publicado na revista Veja, dois entraves que ilustram de forma clara o que contribui para esta barreira incompreensível foram mostrados: os professores do ensino público no Brasil são intocáveis, ao contrário até do presidente da República, e, por conta disso, não são feitas avaliações sobre o desempenho deles. No mesmo texto uma informação simples: no setor privado, onde se aperfeiçoa isso de forma científica, invariavelmente o conceito que recebem é o mesmo dado pelos alunos.

Na América Latina, o único país onde os professores públicos são avaliados é em Cuba. Não por acaso ali se constata o melhor ensino de toda a região. No Paraná, o arcabouço da doutrina educacional pregada pelo sindicato da categoria e que foi implantado nos governos de Roberto Requião, foi criado na Universidade Federal, onde se priorizou a valorização do professor, que não deixa de ser justa, mas fez quase desaparecer o chão da escola.

Segundo a teoria acadêmica, abraçada com fervor pelo sindicato e seguida pelos professores, com as exceções de sempre, a péssima qualidade do ensino é causada pelo governo, por problemas sociais das famílias dos alunos, as instalações da escola, a qualidade da merenda, etc. A responsabilidade básica dos que ensinam não foi arranhada. Na comparação, é mais ou menos o que acontece a um doente com depressão, que culpa todos os fatores externos para justificar seu estado. Se vai ao terapeuta, recusa olhar para si e a tomar os remédios que poderiam ajudar. Assim, continua doente, como se fosse masoquista.

A diferença para a escola pública é que são os alunos os que ficam enfermos – e não por falta de receitas (ver o quadro). Algumas delas, que balizam a pedagogia de quem tem formação humanista, são do mestre Rubem Alves:

– Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O professor, assim, não morre jamais…

– Para isso existem as escolas: não para ensinar as respostas, mas para ensinar as perguntas. As respostas nos permitem andar sobre a terra firme. Mas somente as perguntas nos permitem entrar pelo mar desconhecido.

– Suspeito que nossas escolas ensinem com muita precisão a ciência de comprar as passagens e arrumar as malas. Mas tenho sérias dúvidas de que elas ensinem os alunos a arte de ver enquanto viajam.

É dele também a frase que deveria ser escrita em cartaz e colado na parede da sala dos professores em todas as escolas do Paraná: Se não gosta de gente, não vá ser professor.

Aluno não é número ou massa de manobra para se conseguir benefícios para a classe dos professores. Se não se seguem quatro pilares básicos para o entendimento de quem ensina para quem aprende, o ralo da ignorância fica cada vez maior: conhecer; fazer com conhecimento; conviver com o outro e ser.

Se isso pode ser lido, por aqueles que se sentem incomodados, como tópico de livro de filosofia de botequim, nunca é demais lembrar que a responsabilidade pelo alto índice de evasão escolar (10%) e reprovação (7%) tem muito a ver com a primordial relação de ensino e convivência entre professores e alunos.

A professora Ana Seres diz que a tolerância zero é a única atitude lógica para estes casos de fuga das escolas e repetência. Mas como adotar num universo de mais de um milhão de alunos e com professores cuja militância é capaz de fazer a escola ficar fechada meses, sem prejuízo financeiro para quem deflagra tal coisa? Quando foi secretária da Educação em Pato Branco, sua terra natal, ela conseguiu diminuir ao mínimo os dois indicadores. Ao saber da desistência de um aluno, íamos atrás dele e da família até em outros municípios para não fechar definitivamente as portas do ensino para ele, revela. O sistema de avaliação de professores e alunos também era feito naquele universo educacional. A participação do poder público é fundamental para isso, afirma. Não por outro motivo o maior índice do último Ideb foi alcançado por Foz do Iguaçu com nota 8. Mas só isso não basta, completa ao lembrar que quem faz o chão da escola é o professor – e que isso abre o caminho para o aluno.

Exemplos ela tem.  Foi o professor Sergio Scheneider, que lhe ensinava álgebra num colégio público de Pato Branco, que lhe mostrou a dimensão que existe por trás dos números e cálculos frios – e o quanto é importante ir atrás disso para aprender, e não decorar. Mais tarde, saí da área das exatas para a pedagogia por nunca ter esquecido o que ele passava. E também por ter a felicidade de poder acompanhar a trajetória de ex-alunos, ela que começou a lecionar no tradicional e público Colégio Dom Pedro, em Curitiba. Um deles, Alvaro Cattani, é seu cardiologista. Quando vou ao consultório, além da confiança que tenho no profissionalismo e competência, também gosto de olhar nos seus olhos e perceber que é o mesmo olhar do menino de 13 anos que ainda tem sede do conhecimento e que fiz parte desse processo.

Certamente por isso, ao se deparar com a dificuldade de reverter o quadro atual do ensino no Paraná, ela já tenha pensado em pedir demissão – pretensão imediatamente pulverizada por Alceni Guerra, que a levou para comandar a educação em Pato Branco quando era prefeito. Ele disse: vai desistir sem ter conseguido o que quer?, revela.

Não desistiu mesmo porque antes de assumir o cargo participava da elaboração de um plano para embasar toda a sistemática do ensino, que ela afirma ter sido desconstruída pelo governador Roberto Requião, que priorizou o professor, com aumentos substanciais de salários e tirou o chão dos alunos.

Ainda sob o barulho do que aconteceu na praça naquele 29 de abril de 2015 ela recebeu a missão de, em 40 dias, elaborar e finalizar um plano para a área. Fez e ele virou lei estadual sob número 18.242. Também colocou em prática o plano Minha Escola Tem Ação (Meta), para fortalecer a gestão escolar, melhorar a qualidade da educação e  reduzir os índices de evasão escolar e repetência.

Se os índices nestes dois pontos baixassem, a quantidade de alunos em sala de aula, segundo dados da secretaria de Educação, diminuiria. Mas… O embate com a categoria é difícil, apesar de o Paraná ser um dos estados onde a valorização dos professores, a oportunidade de realizar cursos de aperfeiçoamento, o número de horas-atividade e os salários estão entre os melhores do país, sem contar que os pagamentos, mesmo com longas greves como as do ano passado, nunca atrasam.

O que falta? Diálogo não é. Nas últimas semanas os diretores do sindicato foram à sede do governo, no Palácio Iguaçu, pelo menos uma vez por semana para tratar assuntos do interesse da classe. A faca da manifestação da próxima sexta-feira sempre foi mostrada. A qualidade do ensino aos alunos não esteve em pauta. O nó de tudo está aí. Quem perde? Todos, principalmente quem paga a conta para ter um futuro melhor para os filhos.