Brasil é um dos piores países da América Latina para nascer menina

A violência contra o sexo feminino teve destaque no relatório da Anistia Internacional sobre violações de direitos humanos no Brasil em 2016, lançado no fim de fevereiro, e não justifica qualquer tipo de festejos no Dia Internacional da Mulher, comemorado em 8 de março. Dando continuação a séria de reportagens que a Tribuna vai divulgar nesta semana, o assunto que iremos abordar hoje é a violência contra a mulher.

Uma série de estudos durante o ano mostrou que a violência letal contra mulheres aumentou 24% durante a década anterior e confirmou que o Brasil é um dos piores países da América Latina para quem nasce menina, em especial devido aos níveis extremamente altos de violência de gênero e gravidez na adolescência, além das baixas taxas de conclusão da educação secundária, relata o documento.

De acordo com o defensor público de Cianorte, Thiago Magalhães Machado, o índice de violência contra a mulher na região é bastante elevado. Seja violência física, psicológica, patrimonial, sexual e outras são extremamente recorrentes. Ainda que não seja um número preciso, a violência contra a mulher representa aproximadamente 50% dos processos da Vara Criminal de Cianorte, ou seja, quase metade dos crimes. Ele acrescenta, ainda, que também existem os crimes considerados cifra negra, que são os casos não levados ao conhecimento das autoridades.

 

VIOLÊNCIA CONTRA MULHER EM CIANORTE

A Delegacia da Mulher foi inaugurada em Cianorte em junho do ano passado. De lá para cá, já foram registrados cerca de 330 boletins de ocorrências, ou seja, mais de um por dia. Deste total, apenas 150 resultaram em inquéritos judiciais. Os crimes mais comuns contra mulheres na cidade são o de lesão corporal, ameaça e injúria. Os dados são da Assessoria de Imprensa da Polícia Civil do Paraná. Nesta quinta-feira (9), a delegada Gabrielle Berwig Amaral irá conversar com a reportagem da Tribuna sobre esses números. A matéria completa você confere nas próximas edições.

 

IMPORTÂNCIA DA DENÚNCIA

Consta que, no Brasil, a cada hora e meia uma mulher é assassinada por um homem, em um total de 13 feminicídios por dia. A taxa é de 4,8 para 100 mil mulheres, a quinta maior no mundo, segundo dados da Organização Mundial da Saúde.

Segundo o defensor público, as mulheres podem realizar a denúncia contra o agressor na Delegacia da Mulher, no Ministério Público ou perante o próprio Judiciário. Verificando que a vítima está em situação de violência doméstica, ela pode requerer uma medida protetiva, que pode prever o afastamento do agressor e a incomunicabilidade. Se não for respeitada essa ordem, pode ocasionar a prisão. E caso ela não tenha um meio de subsistência, pode ser compelido a ele o pagamento de uma pensão, explica.

Para a psicóloga Aline Daniele Hoepers, que atua na Defensoria Pública de Cianorte, muitas mulheres têm dificuldade em realizar a denúncia. Em muitos casos elas se sentem dependentes do autor da violência. Essa dependência nem sempre é apenas econômica, porque também pode haver uma dependência emocional daquele vínculo e daquela realidade, diz.

Ela reforça que muitas mulheres também têm medo de levar a denúncia para não passar por um segundo processo de vitimização, precisando relatar a agressão às autoridades, por conta de vergonha e por se sentirem até mesmo culpadas. A mulher, muitas vezes vem de uma cultura, de um âmbito familiar, em que acaba se naturalizando a violência doméstica. A dificuldade de denunciar está ligada a esses aspectos emocionais. E claro, muitas vezes as mulheres nem tem orientação sobre os efeitos e consequências da busca pela denúncia, afirma Aline. Muitas mulheres chegam aqui no nosso espaço de acolhimento e orientação sem ter realizado a denúncia. Elas vêm para cá para terem a informação correta e se sentirem mais fortalecidas para buscar ajuda e direitos.

 

GRUPO DE APOIO EM CIANORTE

De acordo com a assistente social Grazielle Ganhão, muitas mulheres que chegam ao grupo de apoio realizado pela Defensoria Pública de Cianorte, não identificavam outros tipos de agressões além da física. Elas chegam, relatam a violência física e depois passam a perceber o que é a violência sexual, o que é a amplitude da violência psicológica, e passam a significar o que é esse fenômeno da violência que é despercebido por elas mesmas, diz.

Segundo Grazielle, são inúmeros casos diferentes, algumas mulheres já romperam vínculos com o agressor e outras ainda vivem naquela dinâmica familiar e ainda passam por violência. A superação não passa necessariamente pelo rompimento da relação conjugal. Têm casos que são possíveis a reconstrução de vínculos e em alguns casos, o autor da violência concorda em também ser atendido. Muitos casos, por exemplo, estão relacionados com o uso de álcool e fazemos encaminhamentos necessários e a relação pode ser reconfigurada. E temos casos em que as mulheres estão se fortalecendo e empoderando para romper com a situação. É tudo um processo, nada é de um dia para o outro.

 

COMO PARTICIPAR

O grupo de apoio realiza encontros quinzenais e durante o ano são trabalhadas diversas temáticas com as mulheres, para ter uma rede de apoio de enfrentamento à violência. De acordo com a assistente social, o grupo conta com 20 mulheres, mas outras fazem atendimentos individuais por não conseguirem frequentar os encontros. De acordo com informações da Defensoria Pública, de junho de 2015 até março de 2017, mais de 70 casos foram atendidos. Mulheres de diferente classe social, idade e escolaridade são atendidas no grupo. As interessadas podem buscar mais informações sobre o grupo na sede da Defensoria Pública de Cianorte, localizada na Avenida Maranhão, 243. O novo grupo de apoio às mulheres começa no próximo dia 15.