Os ganhos do Brasil com as normas internacionais de contabilidade pública

Por Valdir Coscodai*

Este ano, o Brasil está dando um passo significativo para o compliance, transparência, eficácia e equilíbrio das finanças públicas governamentais no âmbito da União, estados e municípios, com a entrada em vigor do conjunto das Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público – IPSAS (sigla para International Public Sector Accounting Standards). A adesão do nosso país ocorreu em 2015, sendo operacionalizada a partir de um acordo de cooperação firmado pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que editou a Portaria 548/15, estabelecendo cronograma de adoção e implementação até o final de 2024.

É fundamental que os gestores do setor público empenhem-se de modo efetivo para que as IPSAS sejam adotadas de modo integral. Se já estivessem em pleno uso, provavelmente teríamos mais responsabilidade fiscal, poderíamos ter evitado as famosas “pedaladas” e outras manobras de cunho fiscal, de graves consequências, inclusive políticas, e possivelmente haveria menos unidades federativas em situação fiscal delicada, incapacitadas, portanto, de atender devidamente a população com a oferta de serviços públicos.

As IPSAS estabelecem uma nova dimensão à gestão pública, com um olhar mais técnico e gerencial e menos político. Um aspecto relevante é que alteram o regime contábil de caixa modificado (até então prescrito pela legislação brasileira sobre orçamento) para o regime de competência, cujos relatórios financeiros permitem identificar as transações passadas de maneira mais íntegra. Com esse método, há um diagnóstico mais preciso e realista dos ativos e passivos, fundamental para o planejamento, ampliando a previsibilidade das receitas e despesas.

O impacto é bastante positivo, por exemplo, na condução da política fiscal e elaboração das leis orçamentárias, na previsão de investimentos em empresas estatais, redução do déficit, e na maior visibilidade do endividamento público. Ou seja, tudo o que o Brasil precisa neste momento para emergir da crise econômica e voltar a crescer de modo sustentado no cenário pós-pandêmico.

A aderência ampla dos entes da Federação às IPSAS também possibilitaria uma padronização da contabilidade pública no Brasil, facilitando a interação de União, estados, municípios e dos Três Poderes e conferindo parâmetros mais equânimes e definidos para que a sociedade, exercendo um legítimo direito democrático, possa acompanhar e cobrar eficácia na gestão do erário. Além disso, os órgãos de controle passam a dispor de informações mais completas e plenamente auditáveis, e a utilização de normas padronizadas facilita a inserção global, considerando que muitas práticas estabelecidas em acordos e tratados dos quais nosso país é signatário passam por um modelo mais eficiente de contabilidade pública, como o instituído pelas IPSAS. Trata-se de algo importante para as relações multi e bilaterais.

O Ibracon – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil participa do processo de tradução das IPSAS para adoção no País. Além disso, contribuindo para a difusão dessas normas pelos profissionais, fez parte do curso “Auditoria no Setor Público (NBASP e NBC TASP)”, fruto de parceria com o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e o Instituo Rui Barbosa, que tratou do tema com quase quatro mil inscritos e alcançou número superior a 14 mil visualizações no Youtube. Como desdobramento desse curso, lançou a publicação “Implantação das Normas de Auditoria Financeira do Setor Público”, que apesar de não substituir a leitura completa das referidas normas, contribui para a sua implementação e utilização no exame das demonstrações contábeis.

A entidade também promove o “Programa de Capacitação nas Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBC TSP)”, em ação conjunta com o CFC e a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que objetiva capacitar gratuitamente os profissionais da Contabilidade interessados e/ou atuantes no setor público. Esse treinamento, ainda em curso, totaliza 33 horas, divididas em 11 sessões de três horas cada, com mil inscritos em cada módulo.

Reforçando nosso compromisso com o interesse público, o Ibracon defende e considera decisiva a implementação das IPSAS por todos os órgãos e instituições do setor público. Afinal, é determinante que haja avanço de modo qualitativo no atendimento às demandas relacionadas a serviços de educação, saúde, saneamento básico, moradia, segurança e investimentos estratégicos. Mais do que um dever constitucional e legal, trata-se de imposição para que voltemos a crescer de modo substantivo e sustentado e tenhamos melhores perspectivas de desenvolvimento.

*Valdir Coscodai é presidente do Ibracon – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil