Indústria canavieira do Paraná aponta a saída da crise energética

Weslle Montanher/Tribuna de Cianorte

Coopcana exporta por ano 160 mil MWh; energia suficiente para abastecer uma cidade como Cianorte por 15 meses

 

Autossuficientes em geração de energia, as usinas do Paraná possuem projetos capazes de atender até 30% da população do estado. Potencialidade ainda pouco reconhecida e explorada

Resistente a uma série de desafios e dificuldades em detrimento da desvalorização do açúcar no mercado internacional, bem como a queda no preço do etanol hidratado, a indústria canavieira paranaense, hoje, instalada em maior volume nas regiões Norte e Noroeste do estado, tem se mostrado forte em busca de alternativas para manter a produtividade. Embora seja um setor em crise há quase seis anos, segundo avaliação da Alcopar (Associação dos Produtores de Bioenergia do Estado do Paraná), as usinas do estado possuem grande potencial na cogeração de energia elétrica, capaz de ajudar o Estado e até mesmo a União na fuga alternativa da crise energética atual – responsável por consumir bilhões de reais em recursos públicos investidos em projetos de longo prazo.

Weslle Montanher
Linha de transmissão até Paranavaí

Por meio da queima do bagaço de cana, sete usinas sucroenergéticas têm vendido a eletricidade da biomassa para companhias elétricas de outros estados. Como é o que acontece em Paraíso do Norte, no Noroeste. Há três anos a Coopcana (Cooperativa Agrícola Regional de Produtores de Cana Ltda) possui uma parceria com a CPFL (Companhia Paulista de Força e Luz). Na indústria, diariamente são exportados cerca de 30 MWh de energia transmitidos por uma rede elétrica de 22 quilômetros até uma subestação da Copel, em Paranavaí, onde é realizada a distribuição para o estado de São Paulo.

Anualmente, a Coopcana é capaz de exportar um excedente de 160 mil MWh de energia elétrica – suficiente para abastecer uma cidade com 80 mil habitantes ou mais, de acordo com a demanda existente. Dados obtidos junto à Copel comprovam a eficácia da cogeração da usina. Em números, conforme a estatal, um município como Cianorte, de população estimada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 76 mil pessoas, consumiu somente no primeiro semestre de 2015, 65 mil MWh. No ano, a cidade poderá consumir de 130 mil MWh a mais, conforme a necessidade de abastecimento dos setores residenciais e industriais. Com base nesta realidade, apenas o projeto de cogeração da Coopcana seria suficiente para atender toda demanda dos cianortenses, e ainda poderia haver sobras.

Nossa meta hoje é chegar em 2016 com uma exportação diária de energia excedente de 60 MWh. E no ano, produzir mais de 220 mil MWh, revela o diretor presidente da usina, Elias Fernando Vizzotto.  Na avaliação dele, o país não aproveita as possibilidades e potencialidades da biomassa do bagaço de cana. Vizzotto lamenta inclusive a falta de incentivos para a indústria canavieira paranaense, considerada por ele pioneira em projetos da cogeração de energia. Somos um país invejado no mundo em termos de potencialidades energéticas da biomassa, afirma.

Weslle Montanher/Tribuna de Cianorte
Moagem não precisa ser ampliada, pressão das caldeiras é capaz de aumentar cogeração

O processo

Hoje, a usina possui uma moagem de 4 milhões de toneladas/safra  – matéria suficiente para atender a demanda energética interna da unidade e distribuir à CPFL. O gerente de produção da Coopcana, Odair Pacco, explica que para gerar os 30 MWh/dia – exportados para companhia paulista, não houve necessidade de aumentar o processamento da matéria-prima.

Em período de safra, a usina chega queimar 205 toneladas de bagaço/hora, oriundos da produção exclusiva do açúcar e do etanol. Tal energia é desenvolvida a partir da queima do bagaço em caldeiras sob uma pressão de 67 quilogramas/cm2 a uma temperatura de 510°C. É daí que surge a eletricidade. Logo, para aumentar a cogeração de energia elétrica, como explica Pacco, não seria necessário processar mais cana, apenas substituir as caldeiras que atualmente trabalham com pressão inferior, por caldeiras mais potentes.

Sustentabilidade

Weslle Montanher
Processo é considerado sustentável

Pacco lembra inclusive a sustentabilidade do projeto. Segundo ele, a queima do bagaço pode aparentar como agressão ao meio ambiente, entretanto, o trabalho desenvolvido pela usina atua dentro das necessidades sustentáveis, exigidas por lei, para a diminuição de poluentes à camada de ozônio. Processo denominado de ‘lavagem da fuligem’.

A água responsável por filtrar as toxinas do fumaça antes de ser emitida ao meio ambiente, por vez, é mantida em um reservatório específico, onde também recebe tratamento, para novamente ser reutilizada no mesmo processo de lavagem. É um clico constante para minimizar a emissão de poluentes, acrescenta.

Energia capaz de atender até 30% da demanda estadual

Estudo mostra potencial de gerar até 3,2 GWh/ano. Em 2014, sete usinas foram responsáveis por comercializar 755 mil MWh/ano

Atualmente no Paraná existem 25 usinas, todas autossuficientes em demanda energética e com excedentes. Se deste total fossem criados 44 projetos/leilões de cogeração de energia, cada uma com possibilidade real de produzir até 220 mil MWh no ano, apenas as usinas de bioenergia seriam responsáveis por abastecer até 30% da população paranaense, conforme cálculo realizado a partir dos dados do consumo médio estabelecido pela Copel. Em 2014, por exemplo, apenas sete usinas paranaenses comercializaram 755 mil MWh/ano, segundo relatório da Associação dos Produtores de Bioenergia do Estado do Paraná.

Estudo realizado pela Alcopar e Faep (Federação da Agricultura do Estado do Paraná) comprava ainda que o potencial  da indústria canavieira paranaense dentro da cogeração de energia elétrica pode chegar a 3,2 GWh. Sobretudo, para isso acontecer é necessário um investimento de R$ 2,523 bilhões na modernização do sistema de geração de vapor e conservação de energia, melhora de eficiência dos equipamentos e recolhimento da palha, além do uso do bagaço da cana.

De acordo com a Alcopar, no patamar atual, mesmo sem leilões da cogeração, as usinas do Paraná detêm de um potencial capaz de gerar até 20% de toda energia elétrica produzida pela hidrelétrica de Itaipu, além de serem todas autossuficientes em matriz energética. Para Miguel Tranin, presidente da associação, as potencialidades do setor na cogeração são inúmeras e, de fato pouco exploradas. O estado hoje processa 45 milhões de toneladas de cana de açúcar, segundo estimativa da safra de 2015, e representa 7% de toda produção brasileira. Para Tranin, a biomassa é um recurso valioso que acaba por não ser aproveitado a favor da economia nacional.

Todo investimento da União em energia é necessário, porém, os projetos de hidrelétricas [por exemplo], além de custos elevados, o prazo final da obra é de 12 a 15 anos. Já a possibilidade de geração da biomassa, em nossas indústrias pode ser feita em dois anos, podendo suprir a demanda existente, sem emissão de poluentes, afirma o presidente da Alcopar. Em meio à série de dificuldades que o setor enfrenta, Tranin questiona a seguridade de a matriz energética nacional estar alicerçada às usinas hidrelétricas.  Em 2014, as hidrelétricas mostraram sua fragilidade perante o clima. Será seguro?, questiona.

Leilões poderiam dar fôlego ao setor e garantir empregos

140 municípios paranaenses têm a economia ligada à indústria canavieira; com crise cada vez mais intensa, 80 mil empregos estão em risco

Weslle Montanher
Casa de força da Coopcana

A solução para a crise energética a partir das usinas canavieiras parece fácil, no entanto,  para aplicar todo este potencial é necessário investimentos volumosos, que sozinho, o setor não teria condições de financiar, devido às dificuldades em obter crédito, já que parte da indústria enfrenta problemas com a inadimplência em detrimento da crise nos preços de mercado, conforme avalia o presidente da Alcopar.

Para Tranin, além de poder tirar as usinas do endividamento, se o governo investisse na cogeração de energia da biomassa da cana, o Brasil poderia dar um salto em termos de evolução energética, no sentido de suprir a demanda consumidora e até reduzir custos da produção.

Isso significaria também a criação de 10 mil novos empregos diretos, 25 mil indiretos e aumento da produtividade de cana em 15%. Além disso, possibilitaria a arrecadação de mais R$ 284,420 milhões ao ano em impostos estaduais agregados e R$ 458 milhões ao ano de impostos federais, como prevê  o estudo da associação.

Uma da demanda imediata por parte da indústria canavieira seria um novo Plano de Estabilização e Saneamento do Agronegócio, para tentar tirar algumas usinas das dívidas. Já um leilão de cogeração específico para o setor, seria um começo para aliviar as contas, além de assegurar a produção e garantir a geração de emprego “, afirma o presidente da Alcopar.

Cinco usinas no Paraná já interromperam as atividades devido à crise que se agrava perante o setor. O sinal é de alerta, principalmente para economia brasileira. Uma vez que o cenário de dificuldades se repete em todo segmento nacional. No Paraná, segundo a Alcopar, mais de 140 municípios dependem economicamente das usinas e mais de 80 mil empregos podem estar em risco caso a cadeia produtiva sucroalcooleira continue em patamares negativos.