Rodrigo Zanini fala sobre a experiência de estampar uma revista de circulação nacional e admite: preconceito racial me incomoda mais do que homofobia
Aos 16 anos ele começou a ter sua primeira experiência com peças, até então, induzidas ao universo feminino. Ainda em Guarapuava, onde morava com a família, Rodrigo Zanini já se identificava com acessórios e um estilo autêntico de se expressar. Em Cianorte há cincos, ele chegou na cidade para cursar Moda no campus local da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Estilista por formação, e assistente de estilo na Morena Rosa Group há quase dois anos, Zanini é a capa da edição de novembro da Revista Galileu, da editora Globo, que traz como tema Gênero, tudo que você sabe está errado. O convite surgiu em outubro a partir de um amigo que é diretor de arte no periódico. A matéria que discute de forma relevante a temática transgênero e androgenia foi pauta de discussões na internet nesta semana.
As pessoas às vezes me chamam de ela. Mas, não. Não sou ela. Sou ele. Nasci homem, sou homem. A diferença é que eu gosto de me vestir assim [de mulher]. Porque esta é a minha essência, é assim que me sinto bem e confortável. Não me importa o que dizem, comentou o estilista durante um bate papo com a reportagem da Tribuna.
Preconceito
Weslle Montanher
Rodrigo Zazini é estilista e vive
há cinco anos em Cianorte
Questionado sobre preconceito, Zanini foi claro e disse que piadas infames e nomes esdrúxulos fazem parte do cotidiano dele, mas que a não aceitação de algumas pessoas à forma como ele se veste ou se porta, pouco o interesse, afinal, como ele mesmo disse, são pessoas com a mente muito fechada para entender um estilo de vida, ou uma opção que foge da realidade delas.
Apesar dos olhares de esguelha e os risos de deboche, que muitos não conseguem disfarçar, o estilista lembra que o fato de o criticarem pela androgenia não o incomoda tanto quanto o preceito racial. Se uso salto, é normal que algumas pessoas não aceitem, porque para elas pode ser difícil de assimilar, mas o que me machuca é o fato de estarmos em pleno século 21 e muitos ainda me zombarem por ser negro, lamentou.
Para assumir a androgenia é preciso muita coragem, e existe uma consequência por trás dela, eu aceite assumir, e felizmente, em Cianorte, conheci pessoas certas que me aceitam como sou e me apoiam. Sobretudo, o fato de você criticar alguém pela cor dela é inadmissível, afinal, raça ou cor não é algo surreal, utópico e tampouco um tabu, fora dos padrões prescritos pela sociedade. Me dói muito saber que ainda existe racismo. E isto me incomoda mais que a homofobia, admitiu Zanini.
Transgênero
Questionado sobre o assunto gênero nas escolas, o estilista foi cauteloso e disse sentir medo. Penso que a sociedade não está preparada para discutir a pauta transgênero com crianças na sala de aula. É algo polêmico e que incomoda muita gente. Em uma escola você tem crianças de diferentes famílias e classes sociais, e além disso, para falar sobre este assunto, o professor, a escola e até mesmo os pais precisam entender muito sobre ele, afirmou.
Experiência
De fato, para entender um pouco do universo transgênero, não basta apenas teoria. A reportagem andou pelas ruas da cidade com Zanini para perceber a forma como a população reagia perante aquele homem de 1,86m de altura, em um salto de 10 centímetros. Era impossível não perceber que as pessoas paravam para admira-lo. Alguns com olhar de desconfiança, outros com indagação e até com sacarmos.
Se aquilo o incomodava? Não, eu gosto de valorizar meu corpo, eu cultuo meu corpo, é nele onde habito e gosto de me sentir assim. Às vezes evito sair em locais onde sei que não serei bem recebido, mas o importante é eu me sentir feliz comigo mesmo, lembrou.
Sobre o trabalho, Zanini disse que no início tentava usar roupas mais masculinas, para não ‘assustar’ os colegas, entretanto, por trabalhar com conhecidos, as pessoas da própria empresa o questionavam. Rodrigo, por que você não vem trabalhar todo produzido, da forma como você é fora daqui? E a partir disso me senti cada vez mais em casa e feliz comigo mesmo, recordou o estilista.
E aos curiosos de olho na reportagem, Zanini afirmou. Não. Eu não uso saia. E todos os meus saltos são grossos. E, por favor, entendam. Não sou travesti e nem trabalho artisticamente como Drag Queen. Por isso me chamem de Rodrigo [risos], pontuou.
Weslle Montanher“Não sou travesti, sou um homem que gosta de usar roupas femininas. Não sou ela, sou ele”, afirma